Existe “aí fora”, um senso comum que afirma que: “Para fazer cirurgia plástica preciso emagrecer caso esteja fora do meu peso”.
Isso realmente condiz com a realidade?
Vamos analisar separadamente quais os benefícios da cirurgia plástica e do emagrecimento.
O emagrecimento leva a uma perda de peso devido a uma diminuição que atinge absolutamente todo o corpo:
Funciona da seguinte forma: existe uma bola de basquete que deseja emagrecer; ela alcança o seu objetivo e se transforma em uma bola de handball: Ou seja temos uma bola menor mas ainda é uma bola! Emagrecimento promove uma diminuição do seu corpo mantendo o mesmo formato.
Se fosse sempre assim estaria ótimo. Mas na verdade, na maioria dos casos, o emagrecimento provoca distorções e deformidades no contorno corporal.
Vou explicar, mas antes duas notas:
1- a palavra emagrecimento aqui está sendo usada para definir única e exclusivamente a situação em que o indivíduo restringe alimentação seja lá por qual método.
2- há exceções determinadas pela genética.
3- estou considerando que mesmo acima do peso a saúde geral está perfeita.
Quando gastamos mais calorias do que as que consumimos o organismo vai liberar gordura de áreas pré-determinadas, o que é regido pela genética. E a regra geral é, quando perco peso diminui o volume do quadril bumbum e coxas; e no último lugar da fila: barriga.
Em contrapartida quando ganho peso o primeiro lugar a aumentar é a barriga.
E a barriga ocupa o primeiro lugar dentre as áreas que mais incomodam.
Qual o campo de atuação da cirurgia plástica?
A cirurgia plástica:
1- retira excesso de tecido (qualquer que seja ele: pele ou gordura) em áreas pontuais.
2- modifica o formato do corpo e promove transformações no contorno da silhueta corporal, o que é possível devido ao primeiro item.
3- só se justifica quando há uma queixa específica da paciente relacionada a uma área limitada.
Vamos traduzir esses três itens:
Paciente passa em consulta com abdome em avental (excesso de pele que desaba sobre o púbis) o que é um motivo de muitos transtornos inclusive clínicos. Observação: veja que não importa o peso dela; o problema pode estar presente independentemente do peso.
Então temos uma paciente sofrendo (item 3), com um excesso de tecido (item 1), o que está no âmbito de atuação da cirurgia plástica (item 2).
Se a esse raciocínio adicionarmos o fato já citado de que o emagrecimento atua na barriga em última instância, e o triste fato de que emagrecimento em barriga já flácida provoca mais flacidez, só podemos chegar a uma conclusão:
É estupidez pedir para esta paciente perder peso!
Então a resposta à pergunta que introduz esse texto é:
Não precisa emagrecer para fazer cirurgia plástica!
Como surgiu a cultura da obrigatoriedade de emagrecer para se candidatar a uma cirurgia plástica
A obesidade implica em algumas peculiaridades quais sejam:
1- se existe uma obesidade, todos os tecidos estão presentes em quantidades maiores: maior espessura de gordura, maior depósito de gordura nos órgãos intra-abdominais.
2- as deformidades existentes também são maiores: protuberâncias maiores causadas pelo excesso de gordura tanto na parede quanto na cavidade abdominal, esta última gerando distensões musculares exorbitantes.
3- quanto maiores os problemas mais trabalhoso é a sua resolução.
4- deformidades muito expressivas exigem atuações mais radicais (tirar mais, esticar mais, puxar mais, levantar mais, amarrar mais), por exemplo: se o azulejo do seu banheiro tá encardido, você terá mais trabalho e o azulejo terá que ser esfregado mais vezes, com mais força e utilizando produtos mais abrasivos. Óbvio.
5- atuações mais agressivas levam a riscos aumentados de: deiscência (abrir pontos), cicatrizes feias, necrose, desconfortos pós-operatórios.
6- os tecidos adjacentes, que não se encontram no âmbito de atuação da cirurgia plástica, também estão mais prejudicados devido à obesidade, e podem atuar diminuindo o resultado perceptível de uma cirurgia plástica.
7- a expectativa da paciente aumenta na proporção do tamanho dos problemas: quanto pior o aspecto mais ela idealiza o resultado. Diante de todos esses aspectos, 80% (acho que 99%) dos profissionais só conseguem dizer: “TÔ FORA”.
E vou falar uma coisa para vocês, o item que mais pesa, ocupando o primeiro, o segundo, terceiro, quarto e quinto lugar, é a expectativa totalmente irreal das pacientes.
E daí é muito mais fácil, ao invés de explicar tudo isso, virar para paciente e declarar:
“Filha, emagrece 20 kg e depois volta aqui.”
Gente, aqui para nós, é a mesma coisa que falar: “Some daqui e não volta nunca mais.”
De qualquer forma, os motivos para a disseminação desse senso comum que acredita na necessidade do emagrecimento, encontra seus fundamentos muito mais em questões filosóficas do que propriamente em motivos técnicos ou aplicabilidade das técnicas cirúrgicas. Óbvio que o ideal seria operar só pacientes com índice de massa até 24. Mas, agora que já nos permitimos um minuto de surto psicótico, vamos voltar à realidade:
Qual a probabilidade de alguém emagrecer 20 kg? Eu não consigo perder 2 kg!
É possível?
Lógico!!!!
Mas, primeiro, se fosse fácil a paciente já chegaria para a primeira consulta magra, e não esperaria até este ponto para ouvir de um cirurgião plástico que ela precisa emagrecer? Ela já o teria feito.
2- quando emagrecemos de forma radical visando um determinado objetivo, não conseguimos manter o peso, e voltamos ao peso original com mais alguns quilos na bagagem. Então pessoal, na vida real esta não é uma possibilidade, não existe!
Existem pacientes que recebem todas essas informações relativas a obesidade e cirurgia plástica, e decidem tentar perder peso.
O que observamos é uma de duas possibilidades:
1- a paciente não consegue emagrecer e volta a se consultar depois de 10 anos quando não aguenta mais o desconforto. Moral da história: nem fez a cirurgia a qual por menos que melhorasse o problema, já colaboraria para usufruir de um corpo mais bonito; e nem fez as pazes com o corpo original, persistindo na luta constante com o peso, e da mesma forma que o caso anterior, não se permitiu usufruir do próprio corpo.
2- motivada pela chance de operar, ela emagrece rapidamente mas assim que opera, ela relaxa e volta aos hábitos alimentares que a caracterizam, porque ela mantém a sua essência; e aí, engordar depois de uma plástica deforma o corpo, e o resultado é muito pior do que operar estando acima do peso. Eu pessoalmente, explico todas as dificuldades que a obesidade impõe a uma plástica, esclareço todas as limitações que nos impedem de alcançar um resultado melhor, impostas por um corpo gordo, e na hipótese da paciente concordar, eu opero.
E a experiência muito gratificante, inclusive com o advento de episódios surpreendentes, como pacientes que ficam tão felizes com o resultado obtido que tornam-se atletas para preservar e potencializar suas conquistas; pacientes que alcançam um maior controle de doenças degenerativas e auto-imunes (que estão ligadas a depressão); pacientes que começam a perder peso naturalmente; fora o aumento da auto estima que fica estampado no rosto, no gestos, na postura, nas roupas novas das pacientes.
Dentre os problemas observados no abdome é muito comum a combinação de flacidez de pele e depósito excessivo de gordura. Diante desse quadro é compreensível que a razão determine: “Primeiro esvazia toda essa gordura para depois esticar toda a pele excedente”.
A questão é: “Não haverá pele excedente”.
O que não levamos em conta é que estamos diante de um organismo vivo que tem suas próprias regras de como reagir a eventos traumáticos. Na prática isso significa que ao retirarmos toda a gordura ou grande parte dela, o corpo vai entender que sofreu uma grande destruição, acionando todo o seu exército de células de defesa as quais se seguem células responsáveis pela limpeza dos tecidos lesados, e em seguida há a atuação de células de reconstrução. Estas últimas vão criar uma placa cicatricial cujo objetivo é unir todos os tecidos adjacentes (é como se colocássemos concreto em todo o campo de batalha para apagar todos os resquícios de devastação).
Essa parede de concreto está grudada na pele superiormente, e no músculo inferior mente, e isso tem duas consequências:
1- impede completa ou parcialmente que a pele estique.
2- funciona como uma cinta, temporária, que aperta o músculo.
Em uma abdominoplastia é imprescindível haver elasticidade suficiente de pele, que é o que permite fechar a falha criada pela cirurgia.
Portanto a limitação imposta ao estiramento da pele impossibilita totalmente a realização de uma abdominoplastia.
Esse fenômeno em quem tem muita flacidez é catastrófico; mas em quem tem flacidez incipiente, porém que já incomoda, possibilita a realização de apenas uma lipoaspiração e ainda assim, alcançamos uma melhora da flacidez. Falando nisso lembra da segunda consequência: efeito cinta? Pois é, esse efeito complementa os resultados obtidos apenas com uma lipoaspiração, em pacientes com leve distensão muscular. Conclusão: Em quem tem flacidez evidente, a única sequência possível é abdominoplastia seguida de lipoaspiração para adelgazar o retalho.