Outro dia eu realizei uma abdominoplastia em um rapaz, e tenho por hábito entregar aos pacientes um resumo da cirurgia assim que eles retornam no primeiro pós-operatório.
Ele olhou para o papel e disse:
“Quatro horas para retirar só um quilo, doutora?”
Num primeiro momento eu lembrei da mãe dele; mas imediatamente depois eu me dei conta de que realmente era uma questão pertinente, porque todos os pacientes relacionam o resultado com a quantidade retirada! Mas essa não é a realidade.
Mas primeiro vamos lembrar o que é uma abdominoplastia:
Inicia-se com uma incisão de ossinho à ossinho do quadril, através da qual se descola pele e gordura. Após o descolamento vemos os músculos Reto Abdominais os quais são amarrados, e então retirasse um pedaço da pele com a gordura da parte inferior do abdômen que é jogado fora.
Parece uma receita de bolo né?
…bate os ovos com o açúcar e a manteiga, coloque a farinha e ponha para assar…
Mas qual é a quantidade?
Com toda essa historinha eu quero chamar a atenção de vocês para o fato de que existe infinitas formas de fazermos uma abdominoplastia: podemos descolar metade, dois terços, três quartos, quatro quintos… podemos apertar os músculos em uma extensão de um dedo, dois dedos, cinco dedos, não amarrar…
E é obvio que o diferencial de cada cirurgião influência no resultado.
O que determina o índice de melhora é um descolamento bem amplo, importante primeiro para cortar e disponibilizar toda a pele do abdômen acima do umbigo, e 2° para ter acesso à inserção do musculo Reto Abdominal (à sua origem) onde deve começar a plicatura (fechamento ou amarração do músculo) para que o músculo fique reforçado desde o ponto logo abaixo do osso no centro do tórax, e para aumentar a amplitude de aproximação desses músculos.
O pedaço retirado de forma alguma reflete todo o trabalho realizado para alcançarmos um abdômen o mais “chapado” possível e o mais esticado possível, que são os efeitos perseguidos quando realizamos uma abdominoplastia. E esses aspectos só são alcançados com excelentes descolamentos e plicaturas, etapas que demandam muito tempo.
Técnica Cirúrgica
Abdominoplastia é a retirada do excesso de pele associada à plicatura dos músculos reto abdominais. À partir da definição podemos deduzir que se presta à correção de flacidez de pele e flacidez muscular em pacientes onde esses são os principais problemas. Tecnicamente o procedimento é realizado da seguinte forma:
1- fazemos uma incisão horizontal logo acima do osso pubiano.
2- estendemos essa incisão até o ossinho do quadril (espinha ilíaca) na extremidade lateral do abdome inferior.
3- aprofundamos essa incisão ultrapassando pele e gordura até alcançarmos a musculatura.
4- iniciamos um descolamento entre gordura e músculo, que se estende até as costelas, levantando toda a pele e sua gordura subjacente ao que damos o nome de retalho.
5- quando no processo de descolamento atingimos o nível do umbigo, interrompemos momentaneamente o descolamento para fazermos uma incisão circular entorno do umbigo, a qual se profunda até o músculo, e separamos toda a gordura presente ao redor do umbigo deixando o isolado e preso ao músculo.
6- após o descolamento partimos para a aproximação com pontos, das duas lâminas dos músculos reto abdominais, as quais se estendem do osso do esterno até o osso pubiano, cada uma de seu lado.
7- em seguida retiramos toda a pele e sua gordura subjacente do abdome inferior ou seja traçamos uma linha que passa acima do umbigo e se estende lateralmente até se unir com a 1ª incisão que termina na espinha ilíaca. Confeccionados assim um fuso de pele e gordura que é descartado.
8- a pele e gordura acima da linha descrita, é então esticada para uni-la à 1ª incisão através de suturas.
9- no meio desse retalho confeccionados um pequeno orifício cuja cujas paredes são fixadas no contorno do umbigo que permaneceu preso à musculatura. Finalizamos a nossa abdominoplastia.
SE EU TENHO GORDURA NA BARRIGA PORQUE QUE EU NÃO POSSO PRIMEIRO TIRAR ESSA GORDURA PARA DEPOIS FAZER UMA ABDOMINOPLASTIA?
O problema não é o problema.
Porque não compensa submeter-se a uma abdominoplastia quando o umbigo está no lugar?
90% dos procedimentos em cirurgia plástica são realizados em tecidos comprometidos, tecidos que tem a sua qualidade diminuída. E até por conta disso são candidatos a uma cirurgia.
Devido a este detalhe, três meses após um procedimento cirúrgico ocorre uma acomodação dos tecidos, o que na prática é percebido como perda de resultado.
A perda de resultado é parcial e gira em torno de 10%, porém dependendo das condições pode ser muito maior.
Outro ponto em relação a essa mesma causa é que abdominoplastia retira metade da pele ruim e estica a outra metade da pele ruim! Ela não regenera a pele.
Já vimos que em uma abdominoplastia, a gordura abaixo da pele do abdome superior é totalmente preservada. Em pessoas que estão acima do peso ideal a presença dessa gordura abaixo do retalho que se acomodou, dá um aspecto rechonchudo que compromete a nossa percepção de resultado.
Outro fator que compromete a nossa percepção de resultado é a presença de cicatrizes. Todo mundo sabe que abdominoplastia deixa aquela cicatriz em abdome inferior que se estende de um lado ao outro do quadril. Mas essa nem é o problema! Existe também uma cicatriz em torno do umbigo (descrita em Anatomia).
E aí tem duas questões que precisamos levar em conta quando se trata de cicatrizes:
1- não temos nenhum controle sobre como os pacientes vão cicatrizar.
2- particularmente em relação a cicatriz do umbigo, mesmo que ela fique ótima, imperceptível, o novo formato do umbigo pode denunciar a existência de uma cirurgia plástica.
Agora vamos analisar um caso:
Paciente se queixa de flacidez que só é evidente ao dobrar o tronco, curvar-se, e pinçar a pele com as duas mãos.
De pé com a coluna ereta e sem se movimentar, até que o abdômen tá bom; no máximo percebemos um acúmulo de gordura em abdome inferior devido ao aspecto de “almofadinha”, e acentuado, pelo fato da paciente está levemente acima do peso.
Vamos aplicar todos os fatores que geram diminuição de percepção de resultados quais sejam:
1- qualidade de pele diminuída.
2- acomodação dos tecidos pós-cirurgia.
3- depósito de gordura aumentado.
4- cicatrizes inestéticas.
5-formato artificial do umbigo .
Ainda que todos os outros fatores evoluam excepcionalmente bem, ou seja, mesmo que tenhamos cicatrizes perfeitas, acomodação discreta, em pacientes sem depósito exagerado de gordura, a presença de uma pele ruim compromete o resultado e impede que alcancemos aquele aspecto de abdome “firme “.
Então o resultado nunca será 100%.
Imagine se a isso associarmos uma acomodação importante, com perda de 20% do resultado; cicatrizes inestéticas que provocam uma queda de mais 20%; acúmulo de gordura que diminui mais ainda o aspecto de firmeza; e um umbigo estigmatizado que compromete a naturalidade do resultado…
Na comparação entre o antes e depois, a balança pende pro negativo, e a impressão é de piora, porque, pelo menos antes, o aspecto era natural, e no depois, destaca-se muito a presença de cicatrizes. Resumindo ocorre o seguinte:
A presença de cicatrizes obscurece nossa capacidade de perceber todo o trabalho complexo que foi realizado no abdômen, e o quanto melhorou; então para aceitá-las, e concluir que apesar da sua presença, ainda compensou operar, os estragos iniciais devem ser significativos o suficiente.
Dois pontos devem ser levantados ainda:
1- todas essas questões precisam ser aventadas por que na cabeça da maioria das pacientes a abdominoplastia te presenteia com a barriga da Gisele Bundchen! Gente ,isso não é cirurgia; isso É Milagre! E corresponde a uma melhora incompatível com as regras do planeta Terra, girando em torno de 500%.
2- não podemos esquecer que a abdominoplastia corrige a flacidez de pele e músculo; se não faço abdominoplastia, nunca alcançarei esse tipo de resultado.
Considerando isso e equilibrando devidamente o primeiro fator, existem sim casos especiais em que realizamos a abdominoplastia com melhora perceptível MUITO DISCRETA (NÃO DÁ PRA VER), mas considerando-a apenas, o primeiro passo de toda uma abordagem, ao qual se segue uma lipoaspiração visando transformar o formato do corpo, e com isso conseguimos sim, melhoras acima de 100%.
Plicatura dos músculos do abdome.
Agora a moda é as pacientes inquirirem ponto: “Faz a correção de diástase”.
Grande bobagem!!!!
Mas vamos lá…
No centro do abdômen, apresentando-se sob a forma de duas tiras delgadas, e dispondo-se no sentido longitudinal, com origem no osso do esterno e se estendendo até o púbis, encontramos os músculos reto abdominais.
Entre essas duas bandas musculares há um espaço normal, medindo de 1 a 2 cm ao qual denominamos diástase. A diástase existe em homens e mulheres.
A sua presença se justifica pela necessidade de expansão desse abdome nos períodos de gestação. Mas como o homem também tem diástase eu acho mesmo que Deus colocou isso como um “ladrão”, já vislumbrando que nós não conseguiríamos controlar o peso.
Em eventos como gestação e obesidade ou os dois juntos, esse espaço aumenta, e mesmo com a regressão dessas alterações ele não retorna necessariamente, as suas medidas iniciais. Esses eventos não só alargam a diástase mas também laceam os demais tecidos do entorno, que ficam frouxos.
Excluindo a espessura de gordura da parede abdominal, é a frouxidão dos tecidos e a diástase que causam o abaulamento abdominal (barriga proeminente). Porém temos que dispor cada fator responsável pela barriga, em ordem de culpabilidade.
Sem sombra de dúvida, a musculatura ou sua incompetência, causa mais abaulamento do que a espessura de gordura; até porque se a gordura for espessa na parede, ela o é também no interior da cavidade abdominal, o que empurrará o músculo mais para fora ainda, aumentando a protuberância.
Mas entre a diástase e a frouxidão dos tecidos, qual é o vilão dos “barrigudinhos”.
A frouxidão! Constatamos isso na cirurgia.
Se nos limitarmos a simplesmente aproximar as bandas do músculo fechando a diástase, a barriga, mesmo com o paciente deitado, se mantém totalmente mole.
Para começarmos a perceber que a barriga adquiriu uma firmeza real, temos que corrigir três a quatro vezes a largura da diástase.
Mas como fazemos isso?
Ancoramos os pontos 3 ou 4 cm em direção a lateral do bordo medial do músculo, e os aproximamos; é semelhante ao fechamento de um paletó onde os botões não estão na beira do tecido, e sim mais para dentro; no caso da sutura do músculo funciona como se além dos botões dispostos mais para dentro, as casas dos botões também estariam localizadas mais para dentro, partindo então para a aproximação desses pontos. Por isso que essa sutura é denominada “Em Jaquetão”.
A plicatura tem que ser no mínimo, com esse primor, para alcançarmos um resultado significativo. Então não basta corrigirmos a diástase.
Cicatrizes.
Se eu pudesse apontar a melhor qualidade de um cirurgião plástico eu diria: Sabe esconder uma cicatriz!
Pessoal é só uma questão de botar o cérebro para funcionar: Se possuíssemos o poder de controlar a cicatrização e determinar o seu aspecto estético, será que estaria preocupada aonde colocar uma cicatriz?
Óbvio que não, né?
Só que não temos controle nenhum sobre a cicatrização do paciente. O aspecto da cicatriz é de responsabilidade exclusiva do paciente .
A partir desta afirmação temos dois tópicos a considerar:
1- ter expectativas em relação a qualidade estética da cicatriz é realmente legítimo?
2- se já possuo cicatrizes, é razoável que espere a mesma qualidade, após uma cirurgia plástica? Sinto informar pessoal, mas todos os campos de atuação da cirurgia plástica caminham na contramão de uma cicatriz bonita!
Parte dos fatores que determinam que uma cicatriz fique esteticamente aceitável, não são conhecidos, mas duas coisas sabemos:
1- se a paciente já possui evidências de que cicatriza mal (cesária elevada, nódulo no lóbulo da orelha após perfuração, tatuagens elevadas) vai fazer uma cicatriz feia.
Observação: Neste contexto estamos utilizando a palavra cicatrização/cicatriz, para nos referirmos à qualidade estética, e não ao fechamento da ferida.
2- cicatriz odeia tensão! Mas se tem uma coisa que cirurgia plástica faz é botar tensão:
- é a prótese que deixa a mama entuchada (Vocês acreditam que essa palavra existe mesmo? Eu chequei!)
- é a abdominoplastia que deixa o abdome retesado.
- é a mamoplastia que imprime uma rigidez ás mamas.
Mesmo a lipoaspiração, que esvazia gordura, para alcançarmos um resultado excelente, temos que movimentar a cânula centenas de vezes através do orifício na pele, o que pode assar a pele e ocasionar uma cicatriz feia.
Vocês têm que entender que o objetivo da cirurgia plástica é colocar os tecidos no lugar ,e para isso temos que fazer força, puxar, esticar, tensionar, retesar, puxar, forçar, apertar, carcar, (eu dei uma pesquisada no dicionário) enfim vocês entenderam. E esta condição, é tudo e mais um pouco, o que as cicatrizes odeiam; é pedir para provocar uma cicatrização inestética. Eu não sei quem incluiu cicatriz bonita no pacotinho da cirurgia plástica; mas, gente, pode tirar porque isso não faz parte dos atributos da cirurgia plástica.
Então parta do princípio que cicatriz, qualquer que seja o seu aspecto, é o preço a ser pago para vocês conquistarem o formato do seu sonho.
É um preço caro demais para você?
Não faça cirurgia plástica!
Gente, óbvio que tem pessoas que cicatrizam maravilhosamente bem! Mas só constatamos esse fato após a cirurgia, depois de corremos o risco de quebrar a cara . É uma aposta!
E o outro ponto que devemos destrinchar é: “Ah mas a minha cesária é ótima! Eu nem consigo enxergá-la!”
Gente, a cesária reúne todas as melhores condições possíveis para que haja cicatrizes perfeitas.
Vamos analisar :
O obstetra faz um corte na “barrigona”e retira 9 KG (3 de bebê, 1 de placenta, um de líquido amniótico, um de sangue, 2 ou 3 de útero que encolhe).
Ao fechar a cesárea, a sensação é de aproximar dois lençóis ondulantes: a tensão é menos 100, é abaixo de zero.
É uma condição 50 vezes melhor do que abrir e fechar o pescoço para tirar a tireoide; cicatriz que fica imperceptível na maioria das pessoas. Então não dá para tomar a cesárea como parâmetro de qualidade de cicatrização. Comparada a cicatriz de uma cirurgia plástica é como se estivéssemos falando de outra entidade, outra função ou tarefa do organismo.